segunda-feira, 16 de junho de 2008

Meu querido Golias

Márcio Calafiori

Na minha cidade não havia TV. Ou melhor: todo mundo tinha um aparelho na sala, mas a imagem só chegava de vez em quando, duas ou três vezes por mês. Portanto, a nossa diversão era mesmo o cinema.
Em 1967, quando Rio Grande, enfim, começou a receber regularmente a transmissão de TV, a Record nos apresentou um personagem absolutamente engraçado, digno de rivalizar com Jerry Lewis — Ronald Golias. Para nós, guris, não existia diversão melhor que a Família Trapo. Golias era o nosso novo herói.
Quem era mais engraçado? Ele ou comediante americano? Na sala de aula só um achava que o mais divertido era o “Gerry Levis”. Esse colega tinha os seus argumentos, mas para espicaçá-lo botávamos a mão embaixo do sovaco esquerdo e, pressionando-o, fazíamos um barulho parecido com um pum:
Pernachia pra ti, ó... pernachia!
O nosso pernachia era uma mistura do desaforado Bronco, personagem do Golias na Família Trapo, com o Pepino, o personagem de Otelo Zeloni, chefe da família. Por qualquer motivo, a sala de aula virava um coro de pernachias. Na classe, havia também o concurso de quem conseguia fazer a imitação mais legal do Golias. Para imitá-lo, era preciso encompridar o queixo. Isso porque, além do sentimento, o segredo do humor de Golias está concentrado no queixo.
Certa vez passei na rua Augusta, em São Paulo. Lembrei então que o humorista gostava muito de um sapateiro que existira ali. Consta que quando soube que a loja seria fechada para sempre, ele encomendou ao artesão cem pares do mesmo sapato. Genial.
Depois de anos de afastamento, Golias voltou à TV. Sempre que ao trocar de canal eu o flagrava em algum programa, parava para assisti-lo um pouco. E dizia para os meus botões: “Ele nunca mudou. O meu querido Golias continua o mesmo.”

Ronald Golias morreu em 27 de setembro de 2005 de infecção generalizada, aos 76 anos, por volta das 5h30, na cidade de São Paulo.

Um comentário:

Marcus Vinicius Batista disse...

osvaldo e marcio,
em primeiro lugar, parabéns pela iniciativa: unir dois mestres em um único blog. recentemente, acompanhei vários episódios do bronco na rede bandeirantes. o humor dele faz falta, principalmente em tempos de apelação sexual ou escatológica na tentativa de atrair audiência. é por isso que chaves - sem maiores comparações - mantém gerações ligadas na TV, independente do horário. os demais descem o nível como se fosse remédio para a falta de criatividade. abraço!!!