quinta-feira, 31 de julho de 2008

3.

Márcio Calafiori

Já está mais do que na hora de requerer a aposentadoria. Ou então solicitar que o transfiram do necrotério para outro setor. Não agüenta mais. Agora há pouco, por exemplo, estava lendo o jornal e um dos mortos soltou um peido que parecia uma bomba. Que susto!

segunda-feira, 28 de julho de 2008

As surpresas do amor

Márcio Calafiori

Quem sabe aquele ali?... Mas parece tão triste!... Aquele outro manca um pouco... Provavelmente por causa de algum calo velho, teimoso, recalcitrante.
Imagina-se já entediada com a previsão do tempo:
— “Quando o meu calo dá essas ferroadas é chuva na certa!”
Aquele de gravata branca tem cara de pão-duro... E por isso deve sofrer dos gases... Este aqui é o mais bonito do baile, mas está acompanhado da loira falsa!... Oh, meu Deus, como a vida é breve!...
Súbito, um senhor se aproxima:
— Me dá o prazer dessa dança? Adoro essa música do Abba.
Mas pelo amor de Deus! Que cara é esse?... E que música é essa do Abba?...
Não pôde deixar de reparar que ele guarda um pente Flamengo no bolso da camisa. Isso a irrita um pouco.
No salão, ele diz:
— Quase não tive coragem de convidá-la para dançar. Mas não resisti. Tu és a mulher mais linda que eu já vi. Gosto dos teus olhos negros e luminosos.
— É mesmo?... Obrigada!... O senhor também é muito simpático. E elegante, também. Isso é saudável na nossa idade... Está sempre se penteando, não?
— Ah, o pente?... Não sei sair de casa sem ele. É um velho hábito. Mas se isso a incomoda, posso guardá-lo no bolso de trás da calça!
— Ah, deixa assim mesmo... Não tem importância...
— És tão linda que tenho a impressão de que se eu fechar os olhos ao abri-los não vou mais te ver...


Para Adriana